Introdução: A síndrome do QT longo (SQTL) é uma condição clínica que afeta a repolarização cardíaca com aumento no risco de desenvolvimento de arritmias ventriculares graves. A forma adquirida pode ser induzida por medicações, como os inibidores seletivos de recaptação de serotonina (ISRS). Dentre os integrantes desta classe, a Fluoxetina é considerada de baixo a moderado risco como precipitante. Relato do caso: E.A.C.G., feminino, 83 anos, portadora de depressão em uso de Fluoxetina 80mg/dia, admitida em serviço de pronto-atendimento após episódio de síncope. Negou palpitações, dor torácica, pródromos autonômicos, fatores precipitantes ou relação com atividade física. À admissão, apresentava sinais vitais estáveis e evidenciou-se prolongamento importante do intervalo QT em eletrocardiograma, com valor corrigido de 580ms. Na ocasião, foram calculados escores de risco e prognóstico para síncope com pontuação de 3 tanto no OESIL (34.7% de mortalidade) quanto no EGSYS (síncope cardiogênica provável), sendo indicada internação hospitalar para investigação. A propedêutica complementar incluiu dosagem de eletrólitos, realização de ecocardiograma transtorácico, ressonância magnética cardíaca e Holter 24h, que demonstrou atividade ectópica ventricular exacerbada (18% dos batimentos), aumento de intervalo QT, chegando até 630ms em conjunto com batimentos ectópicos ventriculares de alta complexidade e 1030 episódios de taquicardia ventricular não sustendada (TVNS). Associou-se o prolongamento do intervalo QT ao uso de Fluoxetina em dose elevada, sendo realizada retirada, seguida de repetição do Holter 24h após duas semanas, com regularização do intervalo QT, porém persistência de atividade ectópica ventricular com predomínio de extrassístoles isoladas e bigeminadas e quatro episódios de TVNS de até três batimentos. A paciente evoluiu sem novos episódios sincopais e com estabilidade hemodinâmica, iniciando-se Propranolol 20mg 2x/dia. Após alta, manteve acompanhamento com grupo de arritmia. Discussão: Acredita-se que a coexistência de dose elevada de Fluoxetina e de outros fatores de risco como sexo feminino e idade avançada contribuiu de modo incremental à instalação do quadro. Conclusão: O aumento na prevalência de depressão na população geriátrica e o uso indiscriminado de antidepressivos, como os ISRS, podem contribuir para o aumento de complicações cardiovasculares potencialmente graves. Desta maneira, a análise criteriosa do perfil de segurança destes fármacos e o acompanhamento regular são essenciais para detecção e intervenção precoces em caso de alterações.