INTRODUÇÃO: O diagnóstico diferencial das cardiomiopatias que evoluem com aumento da espessura miocárdica é frequentemente desafiador. Apesar de serem as causas mais frequentes a cardiopatia hipertensiva e a cardiomiopatia hipertrófica em pacientes com espessura septal maior que 12mm, amiloidose e doença de Fabry não devem ser esquecidas. Doenças mais raras, como Danon, PRKAG2 e doença de Pompe são frequentemente negligenciadas.
RELATO DO CASO: Paciente de 59 anos, sexo feminino, hipertensa, apresentou episódios de flutter atrial com alta resposta ventricular. Após cardioversão elétrica evoluiu com bradicardia juncional sintomática e necessidade de implante de marcapasso (MP). Ecocardiograma com função sistólica normal e discreta hipertrofia ventricular esquerda (espessura septal de 12mm) atribuída à hipertensão arterial. Exames laboratoriais evidenciavam doença renal crônica estágio 3A. Seus dois filhos também com arritmia supraventricular, um deles submetido à ablação de fibrilação atrial. Após 4 anos, apresentou quadro de endocardite infecciosa. No ecocardiograma, chamava a atenção, além da vegetação em valva tricúspide com refluxo importante, um aumento da espessura septal para 14mm, simétrico, função biventricular preservada e hipertensão pulmonar importante. Submetida à cirurgia para troca da valva tricúspide e extração do eletrodos do MP, evoluiu no perioperatório com necessidade de doses altas de droga vasoativa, terapia de substituição renal, disfunção de múltiplos órgãos e óbito. Estudo genético recebido posteriormente identificou uma variante patogênica c.905G>A (p.Arg302Gln) no gene PRKAG2 em heretozigose.
DISCUSSÃO: A mutação PRKAG2 leva a acúmulo de glicogênio e tem apresentação fenotípica heterogênea, caracterizada pela síndrome de Wolff-Parkinson-White, hipertrofia ventricular, distúrbios do sistema de condução e arritmias supraventriculares. Nesta paciente, flutter atrial de alta resposta ventricular associado à história familiar foram as pistas que levaram à suspeita diagnóstica de doença de Fabry e PRKAG2, sendo esta última confirmada com o estudo genético.
CONCLUSÃO: Doenças de depósito costumam apresentar-se com um curso clínico arrastado e o atraso na sua identificação é responsável por desfechos desfavoráveis. Nos últimos anos, a maior disponibilidade para realização de teste genético, permitiu o diagnóstico de várias cardiomiopatias raras. A identificação da variante pode direcionar para um tratamento específico e modificar a evolução do paciente.
Rx de tórax: presença de MP
ECG pré e pós cardioversão elétrica